Atendendo a algumas respostas apreciativas e inúmeras ignorativas, aqui está......

29 maio 2013

Paul Krugman: um professor americano

Existe toda uma indústria de antagonizar o Paul Krugman. O problema para esse ramo de negócios é que a realidade tende a ficar do lado do antagonista. Já passou da hora dessa indústria cessar as atividades (Chapter 7 of the US Bankruptcy Code, não capítulos 11 ou 13 que regulam reorganização ou concordata; no Brasil, extinção de pessoa jurídica, não mera falência ou concordata).

Para ajudar a entender o professor americano, minha irmã colocou no Dropbox um texto que escrevemos. O texto foi aprovado para publicação, mas impressão está demorando. Enquanto aguardamos, o texto está disponível para nossos colegas, leitores, e estudantes para estudo e uso privado, sem finalidades lucrativas, continuando reservados os direitos autorais. Estou informando porque na minha opinião o texto é instrutivo (mas essa frase traz menos de um bit de informação, porque é claro que eu acharia que é bom).

23 maio 2013

Regimento da pós graduação da Usp

Em 2007 circulou uma proposta de regimento para a pós-graduação na Usp, sobre a qual fiz alguns comentários que talvez o dileto leitor tenha lido (e esquecido).

Circula agora um cartapácio de umas 50 páginas com a proposta de um novo regimento (não tenho link). O regimento atual não é aquele que comentei em 2007, portanto eu perdi o fio da meada - será que a pós-graduação da Usp já teve mais regimentos do que o Brasil já teve constituições?

A nova proposta está escrita em português corrente, correto, e coerente, uma inestimável melhoria em relação ao lixo que circulou há 6 anos. Isso dá conta da maioria numérica das críticas que fiz na época. Dos problemas principais que indiquei, o do idioma para ter sido considerado, embora talvez um pouco timidamente. Os demais - Procedimento para queixas e solução de disputas; Liberdade de expressão; e Integridade e ética - não me parece que encontraram espaço no cartapácio.

Uma coisa que mudou nesse período é que comecei a ler Faoro, que nos Donos do Poder, página 85, nos ensina, sobre as Ordenações Afonsinas, Manuelinas e Filipinas, que "...Não havia, a rigor, direito civil, nem direito comercial, mas direito administrativo..." Em escala menor, o regimento não rege a pós-graduação: ele apenas normatiza as ações da burocra, controla os funcionários do estamento. Errei portanto em imaginar que o regimento faria qualquer menção a conceitos fundamentais para a condução dos estudos avançados. Mesmo considerando minha ignorância, a omissão de mecanismos para solucionar queixas, permitir a livre expressão, e garantir a ética, não deixa de ser sugestiva.

19 maio 2013

A história do futebol brasileiro

A história do Brasil nas Copas deve, no meu entender, ser vista como a batalha entre o talento natural do brasileiro e os donos do poder estudados por Faoro. Senão vejamos. Entre 1930 a 1954 houve a época do complexo de viralata. A organização das seleções era realmente uma tristeza de bairrismo, esbulho, incompetência, e falta de patriotismo. De todo modo o Brasil teve pelo menos 3 times competitivos. Poderia ter tido mais, mesmo assim só não ganhou porque em 1o lugar fica um só, e não foi o time de Leônidas da Silva nem o de Domingos da Guia.

Na era Pelé, entre 1958 e 1970, o gênio desmontou a burocra, que não conseguiu bloquear os demais talentos. Os craques impunham a escalação dos outros craques, independente de hierarquias sociais ou militares. É uma época de exceção.

Os títulos da era Pelé devolvem força aos cartolas, que começam a achar que entendem de bola.
Segue um recrudescimento da força estamental. Apesar da falta de vitórias, os times brasileiros entre 1974 e 1986 são todos competitivos. Nenhum ganhou, verdade, mas o motivo foi simplesmente o acaso do futebol. Mas a repressão ao talento era um tema presente: em 74, Ademir da Guia, o craque que Zagalo desprezou; em 78, Falcão, o melhor jogador do Brasil, ignorado pelos bacharéis do esporte; culminando com a exclusão de Romário, o maior e o mais indomável deles, em 90.

O herói da luta contra o estamento nessa época é Telê, o único que deixava os craques jogarem. Dessa vez as não-vitórias de Telê conduzem à assim-chamada Era Dunga, que se convencionou começar em 90, mas cujas raízes já estão presentes desde 74, e que perdura até os nossos dias, com intervalos. A vitória do estamento foi tão completa que o Brasil quase ficou de fora da Copa de 94. Para não matar a galinha dos ovos de ouro, que é o futebol, o estamento se rende ao craque. Muito a contragosto: o talento de Raí e outros foi reprimido em 90 e o maior herói da luta contra a burocra nessa época, Romário, ficou fora do time que não ganhou em 98. De qualquer forma o Brasil voltou a ganhar: 3 finais em sequência.

A vitória teve um preço. A campanha vencedora de 2002 tranquilizou o estamento, que voltou a atuar sem rédea nem bridão. Os bacharéis - dono de títulos em ordenações afonsinas, currículos de administração ultramarina, e diplomas de física - instalaram o futebol burocrático, sem viço nem vigor, sem risco nem criatividade, de 2006 até hoje. O desastre ainda não foi de monta a restringir a auto-suficiência da nobiliarquia, em renovada versão do complexo de viralata: o brasileiro precisa jogar como os europeus, de preferência lá na Europa mesmo. Mais precisamente: o brasileiro precisa jogar como o estamento, incluindo boa parte da crônica esportiva, acha que jogam os europeus.

Quem entende de bola diz, tartakowerianamente, o que o Brasil só perdeu de 2 adversários: da Hungria em 54, e da Holanda em 74. Das outras vezes, perdeu de si mesmo. Por superestimar o adversário, ou fingir subestimá-lo, o que no fundo é a mesma coisa. Conseguirá o talento voltar a prevalecer contra o fogo amigo dos comitês? A conferir.


16 maio 2013

Winning is for losers

Campeão dos campeões, eternamente, dentro dos nossos corações. O que acontece no Pacaembu é relativamente menos importante.

Agora, que foi roubado foi. O Boca é um grande time, Riquelme é craque, o Corinthians inteiro não jogou bem, e a torcida foi insuficiente, mas 4 anulados entre gols e pênaltis é dose para alufante. Melhor talvez ter ganho ano passado, quando Tokyo deu moleza. Esse ano parece que é dos tedescos.

Falando neles, "winning is for losers" recorda Danish dynamite. O único técnico alemão que prestou em toda a história do futebol foi o Piontek. Justamente por isso, nunca se firmou no próprio país. Os outros todos sempre foram uns Dungas com barbeiro melhorado. Parece que os bávaros finalmente entenderam isso e chamaram um técnico catalão.

Sem Pato na Libertadores, vou até torcer para o galo. Mas o mundial é dos alemães, se não levarem muito frango.

13 maio 2013

Importação de médicos cubanos

A discussão da proposta do governo brasileiro de importar 6 mil médicos cubanos está curiosa. Invertendo as posições tradicionais, a esquerda ataca o corporativismo das associações profissionais. E os conservadores que defendem os controles burocráticos do sindicato dos médicos.

Minha ignorância não sabe o que está certo. Oportunidade de trazer bons médicos já formados a um custo baixo? Oportunidade para um regime falido explorar cidadãos trabalhando em regime de semi-escravidão, com salários arrestados pelo governo? Quebra do monopólio corporativo? Favorecimento dos profissionais mal formados de um regime amigo do governo? Como vou saber?

Aposto que quando o Fidel morrer vamos descobrir que os bons índices de saúde de Cuba são obtidos através de fraudes estatísticas, mas isso não quer dizer que os médicos da ilha sejam ruins. Enquanto isso, se alguém quiser olhar o blog do Nassif para identificar o lado errado da disputa, me conte que eu não tenho paciência.

Horários na Poli

O problema dos horários na Poli é de complexidade computacional proibitiva. Lição de casa: determine se é polinomial, combinatória, NP completa, o que for. Trata-se de alocar cada matéria de modo que nenhum aluno tenha conflito de horários. No imaginário politécnico existe todo o tipo de obstáculo para a flexibilização dos currículos - administrativo, ideológico, ou político. A dificuldade de resolver esse problema de alocação é o único obstáculo real.

A solução convencional é fazer o rabo abanar o cachorro: todos os alunos do mesmo curso fazem exatamente as mesmas matérias, então a complexidade do problema de alocação diminui muito. O currículo fica então subordinado ao algoritmo de alocação de horários. Problema resolvido, problemas maiores criados.

Conversando com minha filha que faz colégio (High School) em Brookline, Massachusetts, me dei conta que o problema de horário é resolvido lá de forma mais eficaz. O horário letivo é dividido em 10 "blocos". Cada bloco contém um número de horas de aula espalhadas pela semana - a maioria 4 aulas por semana, sendo uma com duração um pouco mais longa. Por exemplo, uma disciplina oferecida no Bloco B tem aulas 2a e 4a das 9:15 às 10:10, 5a das 8:20 às 9:30, e 6a das 8:20 às 9:10. Outras atividades didáticas ocorrem em blocos menores. O Bloco X, por exemplo, é apenas uma aula 5a feira, das 10:30 às 11:10.

As matérias mais básicas - história e matemática por exemplo - há turmas oferecidas em mais de 1 bloco, dando alguma flexibilidade para o aluno escolher suas eletivas, que têm menos turmas e portanto são oferecidas em apenas um bloco. A flexibilidade tem um limite natural: o estudante não consegue fazer 2 eletivas oferecidas apenas em um único horário coincidente. De qualquer forma, o problema de alocação das 6 disciplinas de cada estudante em 10 blocos é muito mais simples. Consequentemente, não existem problemas administrativos que impeçam que um aluno do colégio público de Brookline tenha muito mais autonomia para organizar seus estudos do que um universitário na Poli. Por exemplo, um estudante pode fazer um curso de língua estrangeira avançado e matemática no nível mais básico; ou vice-versa; ou ambos avançados, ou básicos, de acordo com seu talento e motivação para o francês, japonês, ou álgebra.

Em contraste, na Poli cada disciplina pode ocupar um conjunto qualquer das horas dentro da grade horária semanal, aumentando combinatoriamente a possibilidade de conflitos de horário. Vou deixar escrita aqui a sugestão de que a Poli e a Usp poderiam adotar um sistema de blocos para racionalizar os horários. Mais tarde quando tiver um tempo livre monto uma tabela com uma sugestão de blocos, com o intuito de deixar mais claro como esse sistema poderia facilitar o planejamento para professores e alunos.

08 maio 2013

Sobre a assim-chamada escola austríaca

Um ex-aluno, hoje colega engenheiro, pediu para apontar erros num texto de um professor da George Mason University. Escrevi alguma coisa para ele no Facebook e copio aqui.

Uma refutação é a poluição. O proprietário de um poço de petróleo vende o óleo, pode deixar derramar, quanto mais vender com menos desperdício (do seu ponto de vista) em proteção ambiental, mais lucra. O comprador também aufere vantagens, por exemplo movimentar seu automóvel. Porém se a complexa operação não for executada com extremo cuidado, ela torna a sociedade inteira mais pobre e sofredora, e a economia futura menos produtiva, por causa da devastação ambiental e dos danos a saúde. A proteção que o estado oferece à propriedade privada em nada ajuda. É necessária uma regulamentação estrita e limitação dos direitos privados, além de impostos pesados, se não quisermos ir para o caminho dos habitantes da Ilha de Páscoa. Essa situação é bem entendida pela ciência econômica convencional, baseada na realidade. Na verdade é menos demorado perguntar o que está certo do que o que está errado na assim-chamada economia austríaca. Essa é um amontoado de lugares comuns elevados à categoria de postulados inatacáveis, apesar de que raramente terem significado mais geral e frequentemente levarem a contradições. Um tipo de astrologia, homeopatia, com paralelo no marxismo.

Outro absurdo que o artigo comete, de ignorância tão profunda que dificulta a presunção de boa fé, é quando ele fala do colonialismo na África. Com um mínimo de cultura literária e histórica o autor lembraria do genocídio no Congo Belga. Talvez o maior crime da história da humanidade. Um gajo que escreve "As potências coloniais jamais perpetraram os indescritíveis abusos de direitos humanos" é quase um cúmplice. O sujeito escrever uma barbaridade como a que ele escreveu num artigo com pretensão acadêmica ou didática demonstra profunda ignorância e má fé.

Meu argumento não é 100% válido, mas o dele é 100% errôneo. Nenhuma regulamentação ou legislação é perfeita, nada no mundo real é perfeito. O não ser perfeito não é argumento contra nada. Quanto às exigências das seguradoras [serem mais eficazes para garantir a segurança de ambientes de trabalho do que a ação direta do governo], o sistema todo só existe porque há leis específicas que exigem seguro contra terceiros. A ação regulatória não precisa ser efetuada totalmente através de atos diretos do governo. Por exemplo, a empresa de seguro pode muito bem ser privada, e em geral funciona melhor, pelos argumentos que você conhece. Esse tipo de argumentação - atacar um straw man, um espantalho a quem o autor atribui linhas de pensamento que ele identifica com seu opositor, apesar de que o opositor nunca as defendeu - é uma falácia de argumentação típica dos assim-chamados economistas austríacos. No caso, dizer que quem defende algum tipo de regulação ou imposto é um comunista absolutamente contrário à propriedade privada.

Tudo isso dito, é verdade que a liberdade individual - inclusive de iniciativa econômica - não apenas facilita a prosperidade mas é um valor humano fundamental que deve ser um objetivo da sociedade independentemente dos benefícios econômicos. Essa é uma das tautologias às quais me referia acima, que entre os picaretas da George Mason é distorcido para defender os maiores absurdos, e para acusar qualquer pessoa que defenda alguma política social ou de impostos de comunista ou algo pior. Recomendação: não perca seu tempo [lendo adeptos da assim-chamada escola austríaca].

03 maio 2013

Opera or operetta?

Tell me if this criterion works. When the music is good and the audience finds it good fun, it's an opera. When the music is dreadful and the audience is dreadfully affected, it's an operetta.

Yes, I understand the metric is unconventional and that it fails to distinguish between Wagner and Strauss, but perhaps inducing the S1 circle topology (as opposed to the R1 real topology) is actually a strength.

Blog do Nassif

De vez em quando dou uma olhada na assim-chamada imprensa alternativa, e hoje fui recompensado com um esclarecimento. Sempre soubemos que blogs como o do Nassif estavam infestados de extremistas. Quem quiser pode conferir a simpatia ao terrorismo na cobertura - e nos comentários - dos atentados da maratona de Boston. Em geral o extremismo está ligeiramente disfarçado: a tiranofilia aparece como anti-imperialismo; o ódio racial se diz anti-sionista; a crítica a alguma política de alguma democracia serve como elogio às ditaduras de partido único; um crime ou erro policial num país livre justifica o apoio a regimes genocidas; a crítica aos defeitos de um jornal motiva a defesa da censura a imprensa; um político desonesto invalida toda o conceito da democracia representativa; e assim por diante.

Mas não é sempre que a simpatia ao nazismo alemão se declara abertamente. Quem tiver estômago, confira.

02 maio 2013

Eixo do Mal?

Bush 43 foi muito ridicularizado pela expressão "Eixo do Mal", que juntava no mesmo balaio regimes e ideologias diferentes e não necessariamente alinhadas. Porém.... as manchetes do jornal diário de hoje às vezes dão a impressão que a aliança entre comunistas, terroristas, nacionalistas, maoístas, salafistas, fundamentalistas, e tiranófilos sortidos, todos unidos numa guerra contra a vida, a liberdade, e a felicidade das pessoas comuns, é mais real do que gostaria de admitir o sarcasmo das personalidades muito sérias.

Debate sobre quotas raciais no Grêmio Politécnico

O Grêmio Politécnico pediu um texto para debate sobre quotas raciais. O debate ainda está para ocorrer, meu texto está aqui. Agradeço ao Grêmio pela oportunidade e pela amável autorização para divulgar.

01 maio 2013

Currículos da Poli

Em 1993 o curso de Automação e Controle da engenharia elétrica da Poli fez uma proposta de flexibilização de currículos. O autor da proposta fui eu. Ela foi aprovada e implantada nos anos seguintes, graças ao apoio e esforço dos colegas do LAC, e especialmente dos professores Vitor Marques Pinto Leite e Jocelyn Bennaton, de quem tenho saudades. Pelo que parece registrar a memória dos vivos, foi a primeira vez que na Poli se permitiu que cada estudante tenha papel importante na direção de seus estudos.

Agora a Escola Politécnica aprovou um currículo mais racional e flexível para todos os estudantes de engenharia. Não sei analisar quanto das ideias de flexibilização foram incorporadas na decisão final, e quanto foi sacrificado para apaziguar o estamento burocrático. Muito menos sei precisar a influência da minha proposta original nesses 20 anos em que o currículo de 1993 foi muitas vezes copiado, imitado, reduzido, modificado.....

Ajudei ou atrapalhei? Quanto? Não sei.

Pequeno ou grande que tenha sido meu papel, pessoalmente sinto essa luta de 20 anos mais como um fardo, perdido nos ermos sertões de Mordor, do que como um triunfo dos sete pilares da sabedoria.

The Road goes ever on and on
Out from the door where it began.
Now far ahead the Road has gone,
Let others follow it who can!
Let them a journey new begin,
But I at last with weary feet
Will turn towards the lighted inn,
My evening-rest and sleep to meet.