Atendendo a algumas respostas apreciativas e inúmeras ignorativas, aqui está......

28 novembro 2011

Fuvest 2012

O vestibular se repete como farsa. Três décadas mais um ano após a Fuvest 1980, que 2 dos 3 leitores devem lembrar, fui ontem fazer vestibular.

Porque? Um dia tomando cafezinho na Usp, ou talvez durante alguma reunião, um colega diz: "O problema da Usp é o vestibular, que não seleciona os melhores alunos" ou qualquer coisa assim. Será? Fui conferir. Da próxima vez, se não puder trazer o McLuhan para a conversa, pelo menos posso dizer "Há quanto tempo o lídimo colega não faz vestibular?"

Antes que perguntem: não vou fazer a 2a fase, não vou tirar vaga de ninguém, não vou fazer Usp de novo.

Fiz o exame na Fac S Judas, do lado do metrô Butantã. As salas de aula são limpas, com iluminação adequada e ventiladores silenciosos. Como cortesia a faculdade distribuiu de brinde uma caneta azul e um lápis verde, inútil durante a prova. A prova começou com 40 minutos de atraso "porque o coordenador teve que resolver um problema com um aluno". Não houve outros problemas de organização.

A prova com 90 questões é difícil, mas me pareceu muito bem feita. Nenhuma questão errada; 1 ou 2 com respostas dúbias, baseadas em teorias históricas marxistas vulgares ou coisa assim, que revelam mais sobre a filosofia uspiana do que comprometem o vestibular. Uma em 10 questões, talvez menos, recaem na "decoreba": saber o nome de uma ou outra organela celular, tratado de Methuen, ou nomes de personagens de romances.

Surpresa: de longe a prova mais difícil é matemática. Tinha que achar a soma dos ângulos internos de um hexágono. Era para os alunos saberem ou deduzirem? Falta espaço para fazer as contas intermediárias na margem. Talvez eles esperem que os vestibulandos usem atalhos e fórmulas que eu não lembro. Quase todas as questões exigem pensar em diversos passos intermediários. Não me parece que a dificuldade da prova é desejável. O assunto em que todos acertam menos é um assunto que faz menos diferença na classificação. Dá mais um motivo para o pessoal estudar menos matemática. Mas as questões em si são bem feitas.

Física é bem mais fácil, não caem exercícios trabalhosos com máquinas de Rube Goldberg. Química eu sei menos, e biologia não sei, mas dá para sentir que as provas são razoáveis. Tinha uma questão discriminatória contra pessoas de uma certa idade, perguntando o que acontece com o cristalino quando o olho muda o foco de longe para perto. Com o meu, não acontece nada. Vou pedir um ponto a mais para os presbíopes ;-)

História e geografia são as partes mais fáceis. É mais interpretação de texto do que lembrar um lista longa de fatos históricos. Não caiu a guerra do Peloponeso. Quem lê jornal, passa. A prova de inglês é curta e bem feita - interpretação de textos jornalísticos. Português tem uma coisa estranha: diversas perguntas sobre detalhes dos livros do ano. É uma opção da Fuvest. Quem faz a prova fora do contexto pergunta: porque esses livros e não outros? Uns não li, outros não lembro. Mas para o vestibulando não é difícil: um ano para ler uma dúzia de livros. Uma boa preparação para a universidade. Não cai aquela inútil gramática de vestibular.

O total geral é que a prova é cansativa. Acho que deve ser mais fácil aos 18 anos. Mas 5 horas sentado na carteira dura pensando e escrevendo não é moleza. Acho que a prova poderia ter 60 a 70 questões sem prejuízo da avaliação. Decerto o que acontece é que cada um quer incluir sua parte, e não enxergam a desvantagem da prova longa. Então está aí porque fiz a prova: só sentando lá você sabe como é a vida do aluno.

Na saída, por alegre coincidência, encontrei 2 amigos, pais de estudantes que faziam a prova no mesmo lugar. Boa sorte para todos, que encontrem uma escola onde serão felizes. Outra hora confiro o gabarito.

10 comentários:

Zappi disse...

Fritz, você é muito paciente! Fazer primeira fase de novo?

Na minha, que foi em 80, estparramei sem querer um copo d'agua na prova de papel-jornal. Ficou tudo grudadinho e não conseguia ler nada.

Nesse dia estava chovendo muito e pensei: está quente, mas se a umidade estiver próxima de 100% esta nhaca não vai secar nunca e estou frito. Já tinha marcado a metade das questões e não tinha vontade de começar tudo de novo!

Aí olhei ao redor, tinha um ventilador em cima de mim. Então pensei: vamos ver, vamos medir a umidade ambiente pela diminuição da temperatura do papel molhado ao vento. Esfriava bastante! Bom sinal. Fui lentamente abrindo o jornal empapado e movendo a folha para frente e para trás, abrindo de novo... todos sabem que aumentando a superfície teremos mais evaporação!

Ao mesmo tempo tomava o tempo das operações para verificar se ainda teria tempo hábil para terminar a prova. Depois de aproximadamente 20 minutos de "secagem" a prova estava novinha em folha e retomei o trabalho.

Tirei 91.

Diego Rabatone Oliveira disse...

Caro Pait,

primeiramente meus parabéns por esta iniciativa!

Acho péssimo que nossa Universidade - que se proclama a melhor do Brasil e da América Latina - seja calcada no hábito da crítica pela crítica, da crítica pela opinião, sem que esta seja forjada pela razão ou pelo conhecimento.

Vejo estudantes (de "esquerda" e de "direita") se degladiando com críticas que ouviram de alguém ou algum lugar, sem a menor preocupação em buscar uma base sólida e real para a mesma. Vejo docentes seguindo o mesmo caminho, criticando as ações dos estudantes muitas vezes sem sequer saber o que estes estão reivindicando e, pior que isso, sem propor algo.

Vejo docentes defenderem com afinco o vestibular e a FUVEST, mas a maioria sequer sabe como é o vestibular hoje - e não estou falando de qual é o estilo das questões, se são interdisciplinares ou não, se requerem capacidade de leitura e interpretação ou se são decoreba, estou falando em não saber sequer que são duas fases, que na primeira são 90 questões para serem resolvidas em 5h e que na segunda fase são pelo menos 3 provas e por ai vai.

Fico feliz que ainda existam pessoas na Universidade que se preocupam em descer dos patamares (seja de "professor da USP", seja de "estudante da USP") para conhecer a realidade e por pensar o que fazer daqui pra frente.

Espero que um dia não sejas uma exceção, mas a regra!

Abraços,

Diego

fbirman disse...

Parabéns! Vai encarar a segunda fase, imaginando que consiga a aprovação? Abraço, Fernando.

Felipe Pait disse...

Zappi, legal sua prova prática de física. Devia cair todo ano ;-) Diego, a ideia foi mesmo descer do salto alto. Analisar a prova friamente no dia seguinte, com o gabarito que ostentas estrelado, não teria o mesmo efeito. Birman, não vou fazer nem a 2a fase nem resmat nem transcal nem eletromag nem mecflu de novo.

Anônimo disse...

boa ideia, fritz (fritz?):

vá além: matricule-se no seu proprio curso e assista algumas aulas suas para ver como é da perspectiva do aluno.

só nao vale usar informacao privilegiada na hora de fazer a prova!

brincadeiras à parte, imagino que a competicao no vestibular aumentou muito dos anos 80 para hoje. as vagas nao aumentaram, mas os candidatos sim, em numero e qualidade.

pelo menos foi o que me disseram quando me explicaram porque o band nao emplacou ninguem (nadie!) na medicina de uns anos atras.

parabens,
sgold

Felipe Pait disse...

A competição pela Usp deve ter aumentado. Por outro lado, há muitas outras universidades, públicas e privadas, então entrar na Usp ou não talvez seja menos crítico.

A ideia de fazer meu próprio curso não é má. Quando eu reencarnar 2 vezes ao mesmo tempo faço isso. Pensando bem, minhas aulas são mais ou menos assim. Aprendo mais que ensino.

Bruna disse...

Fiz a prova ontem e tenho 18 anos. Por mais que esteja a quase um ano no cursinho pré vestibular e estude (quase) todos os dias, não consigo não achar a prova difícil. Talvez seja porque além das 90 questões haja toda uma pressão de ter que passar em uma faculdade para não pagar mais um ano de cursinho.
Sim, há outras faculdades, algumas particulares, que possuem bons cursos atualmente. Mas alguns estudantes ainda dependem de uma vaga em uma universidade pública para estudar.
Por fim, quem diz que o vestibular não seleciona os melhores não deve fazê-lo a muitos anos, porque para controlar o emocional na hora da prova, lembrar de diversas matérias revisadas no ano e conseguir uma nota alta a pessoa tem que ser muito boa.

Felipe Pait disse...

Bom ponto, Bruna! A prova é dura. Dizer que os alunos são mal selecionados é muita falta de consideração para quem fez tanto esforço.

Só seu comentário já valeu ter feito a prova. Aprendi bastante.

Christian Walter disse...

Caro Pait,

Tenho 17 anos, prestei essa FUVEST de 2012 para a Poli, não passei (grande parte pois não conclui, ainda, o Ensino Médio). Nesse ano, estou novamente na jornada rumo à Poli, dessa vez confiante em ser aprovado.

Pela minha experiência com outros vestibulares, como o do ITA, o da Unicamp e o ENEM, digo com segurança que o da Fuvest é o melhor elaborado e que seleciona o melhor candidato. Tendo feito as provas da FUVEST desde 2001 como estudo, posso dizer que conheço bem seu padrão e que, a partir de 2000, a Fuvest atingiu seu padrão atual de qualidade, que é inalcançável.

Entretanto, o vestibular do milênio passado de fato sofre dos problemas citados no texto "A Poli como ela é". Enquanto posso afirmar sobre a melhora inegável no vestibular da Fuvest, não sei se houve as mudanças estruturais reclamadas pelo JD Borges.

Você, como professor, poderia me esclarecer sobre a estrutura atual da Poli? Tenho uma visão muito positiva da Escola, e tornar-me politécnico, participante do grêmio e da empresa júnior tornou-se meu maior sonho.

Um grande abraço,
seu futuro aluno (se tudo der certo)

Felipe Pait disse...

Walter, em 1o lugar, boa sorte! Na Poli, ou, como você indica, em algum dos outros excelentes cursos superiores disponíveis.

O texto do JD Borges é antigo, mas infelizmente muita coisa ainda não melhorou. Outro texto muito crítico é do Jotagá Crema, "Como desisti da Escola Politécnica", http://j.mp/zQRToU

Por outro lado o Paulo Blikstein, patrono da turma de 2012 da Poli, fez um belo discurso: "Para o engenheiro, o mundo nunca está pronto", http://tltl.stanford.edu/blog/paulo/para-o-engenheiro-o-mundo-nunca-esta-pronto

Na época de estudante, ele também escreveu umas críticas fortes sobre a Usp, mas leia o discurso recente e note que há coisas positivas sobre a experiência dele.

Objetivamente quanto aos currículos da Poli e da Usp em geral, pouco mudou mas há propostas de melhora que podem vingar num futuro próximo. A burocra impede de fazer previsão mais firme. Mas os estudantes estão a cada ano mais antenados com o que acontece no mundo, e eu diria que os professores também vão melhorando a qualidade do trabalho. Então dá para ser otimista, sem ilusões excessivas.

Mais uma vez, bom proveito em seus estudos!